segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Cartas de Guerra: o prisioneiro judeu

Auschwitz-Birkenau, 14 de agosto de 1942.
Querida Adelle,
Oh! Sinto tanta a sua falta. A saudade é tanta que nem chega perto do sofrimento que estamos passando aqui em Auschwitz. Milhares de judeus estão sendo mortos aqui, nas câmaras de gás que tem aos montes aqui. Quando não é esse gás invisível e letal que nos mata, é um tiro de uma pistola P38 na nuca que resolve o problema. E também tem os maus tratos que os soldados SS fazem a gente passar, tanto aqui quanto nos campos de trabalho forçado.
A nossa instalação cabe cerca de dois mil homens, que são empilhados aos montes em beliches de três andares para que a cada dia que passe, possa ter mais espeço para mais prisioneiros. O que comemos mal dá pra nossa sobrevivência; basicamente um pedaço de pão preto velho e uma sopa rala que mais parece água suja.
Temos apenas cinco latrinas, o que dificulta a ida ao banheiro, pois a disenteria está atacando e todo dia faz uma nova vítima. Outra coisa que está nos atormentando são os piolhos. Todos os novos prisioneiros quando chegam, vão direto para os chuveiros, nus, e tem a cabeça, as axilas e a virilha raspadas para evitarem um surto maior dessa praga.
Por sorte consegui escondido com um soldado, a base do suborno de dois cigarros que achei em um dos campos de trabalho forçado, esse pedaço de papel e um pedaço de lápis para poder lhe escrever. À noite, me pego pensando no nosso último Hanuká, com a nossa família reunida antes de nosso bairro ser invadido pelos SS.
Hoje sonhei que estava livre, no pós-guerra. Acordei assustado e desatei a chorar. Não gosto de ficar pensando muito no pós-guerra. Alguns dizem que pensar nisso é bom, pois faz com que acreditemos em algo. Mas as minhas esperanças são repelidas pra longe logo que o sol nasce.
Agradeço a Deus todos os dias por você ter se livrado de tudo isso e ter se refugiado a tempo. Às vezes, a minha fé parece que vai se esvaecer quando lanço meus olhos nos dos comandantes do exército e vejo que ali não tem piedade e que a guerra não irá acabar tão cedo assim. Mas Deus me dá força através de meus pensamentos passados juntamente com você e nossa família.
Tento acreditar que tudo isso vai acabar em um piscar de olhos e ter confiança em mim mesmo, pois se eu cair agora será para um destino que muitos estão tendo aqui. Você deve saber qual é.
Apesar de o papel ser paciente, tenho que me adiantar, pois toda essa paciência está se esgotando e lá se estão indo as suas últimas linhas.
Não sei se esta carta chegará até você e muito menos se iremos nos reencontrar novamente. Gostaria de entregar essa carta pessoalmente a você, mas caso ela não seja entregue por mim, você saberá o caminho que o destino me levou.
Te amo com jamais amei alguém. Adeus minha amada.

Benjamin Nussbaum.

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